Bolsonaro preso, entreguismo à solta
- Redação
- 4 de ago.
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Atualizado: há 2 dias

Na noite desta segunda-feira, 04, Alexandre de Moraes decretou a prisão preventiva de Jair Bolsonaro, na forma de prisão domiciliar. O ato ocorre após sucessivas violações das medidas cautelares praticadas pelo chefe do golpismo brasileiro. O paradoxo da situação nacional persiste: a extrema-direita faz com que notórios entreguistas, como Geraldo Alckmin, integrante histórico do PSDB e defensor acérrimo das privatizações nos anos de 1990, posem de patriotas, e um poder tão aristocrático e demofóbico como o Judiciário figure como defensor das “instituições democráticas”.
Seja como for, não deixa de ser ilustrativo notarmos, de um lado, a agudeza e atualidade da questão nacional, dita como morta e enterrada por diversos “teóricos de ocasião”, que até outro dia louvavam a vitória do livre comércio e a diminuição do papel do Estado, assim como os tradutores “progressistas” da ode liberal, alguns dos quais chegaram a imaginar o Brasil como potência imperialista... De outro lado, também é essencial esclarecer que na dita polarização que tem marcado a política institucional do País, se Bolsonaro e seu campo expressam a defesa de um alinhamento total aos ditames e interesses norte-americanos (dando continuidade à “linha dura” dos porões do regime militar, para os quais “o que é bom para os Estados Unidos é bom para o Brasil”), o espectro reunido em torno de Lula e do PT não representa um autêntico projeto de soberania nacional, mas uma tentativa de barganhar, entre Estados Unidos e China, uma participação algo maior da grande burguesia brasileira e do latifúndio na sociedade minoritária que mantém na espoliação das riquezas naturais e da força de trabalho nacionais.
Um exemplo. Hoje mesmo, a imprensa internacional repercute a descoberta, pela gigante petrolífera britânica, British Petroleum (BP), na Bacia de Santos, de uma enorme reserva de petróleo, a maior da companhia em vinte e cinco anos. A BP adquiriu 100% de participação no Bloco Bumerangue, com a estatal Pré-Sal Petróleo SA (PPSA) como gestora do contrato de partilha de produção. As ações da BP, cuja história se confunde com os saqueios e desmandos do imperialismo inglês, subiram 1,4% na Bolsa de Londres. Trata-se de riqueza nacional drenada para abastecer os cofres de uma potência estrangeira. Como se sabe, o Brasil, embora seja um grande exportador de petróleo cru, importa petróleo refinado inclusive de outros países periféricos, como a Nigéria.
Sem dúvida, sob Bolsonaro e Guedes –e ainda mais sob um eventual governo erigido após um golpe de Estado – este processo entreguista ocorreria sem quaisquer freios. Se Donald Trump usa das tarifas para arrancar ganhos de curto prazo (em si mesmos, questionáveis) para a sua base social no interior dos Estados Unidos, está claro que no caso brasileiro há uma nítida interferência política em nossas questões domésticas, que caminham juntamente com acenos de Lula ao social-imperialismo chinês. Sim, acenos, pois efetivamente o governo petista recusou entrada na Nova Rota da Seda, preferindo negociar acordos em separado. Com efeito, há cerca de um mês, os governos brasileiro e chinês assinaram um memorando de entendimento para construir uma ferrovia que ligue o litoral baiano até o porto de Chancay, no Peru, passando pelos estados de Goiás, Mato Grosso, Rondônia e Acre. Esta ferrovia, que escoaria sobretudo carne e grãos, encurtaria custos e tempo do frete entre a América e a Ásia. Trata-se, em suma, do clássico modelo imperialista de drenagem das riquezas nacionais, em parceria com setores das classes dominantes locais. Mas este acordo não interessa, naturalmente, aos Estados Unidos, os quais, pelo contrário, têm elevado sua presença e a militarização no Canal do Panamá, exatamente para impor dificuldades à China no comércio americano.
Isto prova, em primeiro lugar, que não se pode compreender plenamente as disputas políticas internas de um país dominado, como é o caso do Brasil, fora da disputa pela partilha do mundo travada pelas principais potências da atualidade, tanto a dominante (EUA) como a emergente (China). Prova também, em segundo lugar, que nosso país, um grande produtor de alimentos, detentor de colossais recursos energéticos e minerais, além de um importante mercado consumidor, não passará incólume à disputa por hegemonia mundial. Fracassado o plano trumpista de desestabilizar, via tarifaço e chantagens no campo diplomático, o governo de turno, no intuito de viabilizar um candidato da extrema-direita para 2026, ele voltará à carga para mobilizar a súcia fascista para um golpe de Estado, de novo e de novo. Lula, por sua vez, tentará se equilibrar entre duas canoas, tanto externamente (China x EUA) quanto internamente (Congresso x sua própria base eleitoral) mas as suas margens de manobra são cada vez menores, tanto em um cenário quanto em outro. Nessa manobra, o primeiro a ser jogado aos leões será o interesse popular, como se vê no recente programa anunciado pelo Ministério da Saúde, que transferirá bilhões de reais da rede pública para a manutenção de leitos na rede privada. Tudo em nome, é claro, da sacrossanta governabilidade.
Dessa instabilidade que se avizinha, só há uma certeza: sem uma verdadeira Revolução de Nova Democracia, que rompa com o imperialismo e seus aliados internos, não é possível falar em soberania nacional nem em direitos sociais para os trabalhadores. Nossos interesses não estão representados nas mansões e palácios, nem pelas legendas agrilhoadas aos pesados jogos de interesses dos lobistas que mantêm bancadas no Congresso. Pelo contrário, só podem ser defendidos pela nossa própria mobilização independente.