Funk: uma história de luta
- Redação
- há 22 horas
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Atualizado: há 2 minutos
É correto afirmar que o funk é uma das principais expressões culturais do Rio de Janeiro e até mesmo de todo o país, e isso é um fato devido a sua alta popularidade entre os jovens principalmente periféricos do Brasil. Assim como toda expressão cultural que está presente nas classes mais pobres e possui origem na mesma, o funk é muito criminalizado e condenado pelo Estado e classes dominantes, tendo seus expoentes perseguidos e os bailes funks sendo atacados pelas polícias militares de todo o país há muito tempo.

Desde que chegou ao Brasil esse estilo musical sofreu diversas modificações. Nos EUA, onde surgiu, o funk derivou de um momento de alta dos estilos da chamada ‘’Black Music’’ durante a década de 1960, com o blues e o jazz que tinham muito destaque em meio a um momento crucial da luta pelos direitos civis da comunidade negra estadunidense. Esses estilos tinham uma característica de falar sobre a vida dos pretos, do cotidiano da periferia e sobre suas lutas. O funk em sua origem, se assemelhava muito mais a esses estilos com um viés mais ‘’dançante’’, do que temos no Brasil hoje.
Seria pretensioso definir uma data exata para a chegada do funk em terras tupiniquins, porém existem relatos ainda no início dos anos 1970, com os ‘’bailes funk’’, já tendo certo destaque. Nesse período, ainda era um funk mais próximo ao que havia nos EUA, inclusive com letras em inglês, e os bailes eram mais restritos a boates nos subúrbios do Rio de Janeiro. Foi durante o início da década de 1980, com influência do rap, que foi-se modificando um pouco o estilo musical, inserindo o elemento do DJ e adotando ‘’bits’’ mais agudos e letras agora em português, se distanciando um pouco do estilo anterior.
Foi durante esse período que o funk foi se espalhando pelas periferias cariocas e os bailes começaram a se popularizar, dando início a um grande movimento de bailes por todas as favelas da região metropolitana do Rio de Janeiro. Logo esses bailes começaram a entrar no ideário cultural do Rio e ganharam fama também em vários outros estados, principalmente pois havia nesses bailes um ponto identidade muito forte das comunidades, pois havia dentro do bailes diversos grupos diferentes da favela que se encontravam lá, com o funk como ponto de unidade.
Nesta época as letras retratavam muito sobre o cotidiano da favela, da vida difícil do povo favelado e principalmente sobre os anseios de uma realidade diferente, como é a letra de um dos funks mais famosos, o ‘’Rap do Silva’’ que retrata a vida de um trabalhador assassinado por ser funkeiro, e fala sobre como o funk é resistência, e o baile o lugar onde todos na favela se encontram e podem ter acesso a lazer e cultura.
Exatamente por essa capacidade dos bailes em criar uma unidade dentro das favelas, que o funk começou a ser criminalizado e os bailes atacados sumariamente. Começou-se a alegar que as festas tinham ‘’brigas’’ e que geram violência, por conta de grupos que se denominavam de ‘’lado a’’ e ‘’lado b’’, e culturalmente se ‘’enfrentavam’’ durante as músicas, enfrentamento este que por vezes era físico. Além desse discurso, a questão das drogas começou a ser usada também para atacar os bailes e justificar ações da polícia que até hoje persistem e matam centenas de pessoas por ano em todo país.
O que chama atenção e é sintomático é que em diferentes shows de rock (em suas mais variadas categorias) há também uma espécie de ‘’lado a vs lado b’’, que são as famosas rodas punks que muitas vezes também geram brigas generalizadas. As drogas também estão presentes, em grande escala inclusive, em todas as baladas da Zona Sul do Rio de Janeiro e, no entanto, nem os bares de rock nem as baladas são interrompidos pelo BOPE. O que se trata aqui é de perseguição, de privar os mais pobres de terem acesso a cultura e lazer.
Essa situação é sustentada principalmente pelos monopólios da mídia, que desde muito tempo produzem diversas reportagens tendenciosas sobre o tema e classificando os bailes como uma espécie de carnificina, o que acaba gerando de fato carnificinas com as operações policiais que ganham legitimidade para matar pessoas inocentes. Como é o caso da chacina feita em Paraisópolis-SP pela ROTA em 2019 que matou 9 jovens em um baile funk ou o assasinato do trabalhador Herus em meio a uma festa junina no Morro Santo Amaro, ao qual foi justificado que o BOPE estaria indo acabar com um baile funk na favela, e tantas outras chacinas que ocorreram em meio a invasões a bailes funks.

A partir do início dos anos 2000, além dessas desculpas, passou-se a criminalizar também os próprios MCs que passaram a ter mais críticas à polícia, relacionando-os às facções criminosas do Rio. O crime de ‘’apologia ao crime’’, começou a ser utilizado como desculpa para prender diversos MCs que incomodam. Isso vem se arrastando e chegou ao ápice com a prisão do MC Poze do Rodo, que foi preso de forma truculenta e não teve seus direitos respeitados: ao ser levado para o presídio sem camisa e descalço, em uma cena orquestrada ridícula.
Porém, devido a intensa mobilização popular que denunciou o absurdo e pressionou para que seus direitos fossem respeitados, foi solto uma semana após ser preso. Sobre isso, o editor da RRC Igor Mendes escreveu:
E é esse o modus operandi, não importa se o MC é mais ou menos famoso, a criminalização e perseguição é intensa. Como é a situação do MC Oruam, que tem se posicionado contra a perseguição ao funk e durante a prisão de Poze, mobilizou bastante contra a situação. O próprio Oruam também foi preso nesta semana, após ter sua casa invadida pela polícia civil à noite e sem mandado prévio.
O funk é perseguido desde sua chegada ao Brasil e enquanto mais se popularizou, mais essa perseguição se intensificou, pois sempre esteve relacionado ao povo periférico deste país e se transformou em uma expressão genuína do mesmo, e isso as classes dominantes não toleram. O funk é perseguido desde sua chegada ao Brasil e enquanto mais se popularizou, mais essa perseguição se intensificou, pois sempre esteve relacionado ao povo periférico deste país e se transformou em uma expressão genuína do mesmo, e isso as classes dominantes não toleram. Portanto é imperativo defender o funk de toda essa perseguição e denunciar todas essas tentativas de apagar todo esse legado.