Nem anistia e nem concessão: Só o Poder Popular destrói o fascismo!
- Redação
- 19 de set.
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Menos de uma semana após o julgamento no Supremo Tribunal Federal que condenou Jair Bolsonaro e demais corréus a longas penas por tentativa de golpe de Estado e outros crimes, já amadurece a concertação das classes dominantes para anistiar os seus pupilos. Sobre o próprio julgamento, cabe assinalar, de largada, que entre os implicados (oficiais militares, políticos e burocratas) havia uma ausência eloquente: os financiadores do fascismo tupiniquim. Afinal, anos de passeatas, viagens, acampamentos e articulações -ademais da própria “festa da Selma” a 8 de janeiro de 2023- não foram viabilizados gratuitamente. Onde estão os especuladores, empresários e latifundiários que financiaram a arruaça, e que seriam os maiores beneficiários do programa econômico ultraliberal aplicado pela Junta Militar?
Todavia, a discussão sobre a “exemplaridade” do julgamento, que supostamente igualou figurões e figurinhas, não chegou a durar nem sequer uma semana. A toque de caixa, a Câmara dos Deputados aprovou a chamada PEC da blindagem (rebatizada PEC da bandidagem), que impede a investigação de parlamentares sem a autorização dos seus pares, instituto de espírito medieval que cria castas de privilegiados imunes à lei. Não por coincidência, foi o dito “centrão” (e o centrão nada mais é do que a soma de pré-capitalismo e escória burguesa) quem articulou tal proposta, na sequência do avanço da investigação da corrupção das emendas parlamentares no STF e das operações contra o PCC e seu tentáculo na Faria Lima, operações estas que aparentemente motivaram o assassinato em retaliação do delegado aposentado da Polícia Civil de São Paulo, Ruy Ferraz Fontes. Um dos patrocinadores da famigerada PEC é Antônio Rueda, presidente do partido reacionário União Brasil, investigado pela Polícia Federal como possível operador do PCC. A rigor, ele é base do governo federal, pois seu partido conta com três ministros no governo de Lula, embora acene agora (quase ao término do mandato) com um desembarque em direção à candidatura, ela própria ainda incerta, de Tarcísio de Freitas. É aqui, aliás, onde está o busílis da questão.
No mesmo dia em que aprovou a PEC da blindagem -com doze votos favoráveis da bancada do PT-, a Câmara ratificou por maioria de votos a tramitação em regime de urgência de outra PEC, a da anistia aos condenados nos atos de 8 de janeiro de 2023 e conexos. O projeto usado, a princípio, como “esqueleto”, é o do senador Marcelo Crivella, figura reptiliana do submundo carioca, que literalmente libera geral, de Bolsonaro à massa de manobra. Na verdade, tudo indica que ele não será aprovado nestes termos, mas algo chamado agora de “PEC da dosimetria”, que reduziria as penas dos condenados e abriria caminho para a prisão domiciliar do capitão do mato e seus sequazes de alto coturno. No fim das contas, a tal PEC da bandidagem parece figurar como espécie de bode na sala (dada a sua tremenda impopularidade e possibilidade de gorar já no Senado), usada para distrair a atenção do acordão da direita para aprovar uma semi-anistia que sirva ao mesmo tempo para tirar Bolsonaro de cena e criar uma candidatura competitiva contra Lula.
Com efeito, a imprensa noticiou, nesta sexta 18, como se fosse coisa natural, uma reunião presidida por Michel Nosferatu Temer em que conversaram o relator da PEC da anistia, Paulinho da Farsa Sindical, Aécio Neves, o que sempre renasce do pó, Hugo Bosta e os ministros do STF Gilmar Mendes e Alexandre de Moraes (os três últimos, remotamente). Trata-se de uma espécie de birô político não eleito da burguesia liberal, disposto a reescrever a história segundo seus próprios interesses. Segundo Michel Temer, todos teriam concordado em aceitar uma proposta de redução de penas dos galinhas verdes, em nome da “pacificação do país”. De forma cínica, trata-se a cadeia de golpistas como causa de instabilidade, quando há poucos dias não houve qualquer comoção popular perante a mais do que aguardada condenação de Bolsonaro. Além disso, na prática, os mandatários do golpe se livram de suas penas antes de começarem a cumpri-la, quando vários de seus soldados detidos no 8 de janeiro já pagaram anos de cárcere. Não deixa de ser uma ironia que o tratamento diferenciado entre a turba e os chefes expresse de modo didático o caráter de classe da sociedade capitalista que tanto uns quanto outros defendem com tanto esmero. Parece um segredo de polichinelo que a contrapartida de Bolsonaro à suavização da sua pena é o apoio à candidatura indicada pela direita, que pende hoje para o reacionário governador de São Paulo.
Diante deste cenário, é preciso rechaçar com vigor qualquer anistia aos implicados na tentativa de golpe de 2022. Este seria apenas mais um incentivo ao golpismo futuro, como foram as anistias às tentativas fracassadas de golpe entre os turbulentos anos de 1954-1964 e depois à extrema-direita e seus operadores dos porões do regime militar. Ao contrário deles, os lutadores do povo que se beneficiaram da limitada e controversa anistia de 1979 já haviam pagado um preço enorme na forma de exílio, torturas e longas penas, sem falar daqueles que foram assassinados extrajudicialmente. Igualar as duas circunstâncias é uma completa e repugnante ignomínia.
O que se vê com nitidez em toda esta situação é o fracasso da política de apaziguamento adotada pelo atual governo Lula/Alckmin. A desilusão com seu discurso econômico assentado no respeito à “responsabilidade fiscal” e sua aliança com os setores mais fisiológicos do Congresso Nacional alimentam a hidra golpista, à espera do momento oportuno para levantar novamente a cabeça. Esse foi o mesmo governo que sepultou todas as discussões sobre o fim da escala 6x1, mas que acena com uma reciclagem meramente figurativa de um discurso nacional-desenvolvimentista, com fins eleitoreiros. Qual projeto efetivo de soberania nacional o PT, que governou o país na maior parte do século XXI, propôs e implementou? Nenhum, a menos que se apresente como tal certos programas de mitigação da pobreza que nunca atuaram no sentido de mobilizar e emancipar os trabalhadores , os quais, aliás, devem ser vistos como direitos e não como favores. Ao movimento popular, cabe atuar com independência e não deixar-se arrastar como mero apêndice dos partidos burgueses, levantando em qualquer manifestação os seus próprios interesses. No fim das contas, entre o Congresso, o Executivo e o Judiciário prevalecem contradições não antagônicas, no seio de uma mesma ordem opressora; somente uma nova democracia assentada no poder de operários e camponeses poderá defender a nação da agressão imperialista e os trabalhadores do jugo de um punhado de bandidos políticos.