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Sobre a exploração de Petróleo na Foz do Rio Amazonas

Atualizado: há 5 dias


Mapa da posição do bloco 59 da Petrobras. Infográfico: Rodolfo Almeida/SUMAÚMA
Mapa da posição do bloco 59 da Petrobras. Infográfico: Rodolfo Almeida/SUMAÚMA

Reserva de petróleo em águas profundas


Uma nova possibilidade de reservas petrolíferas em águas profundas localizadas na costa brasileira, mais especificamente na Foz do Rio Amazonas, tem sido tema de debates envolvendo as castas política e empresarial de um lado e comunidades tradicionais e ambientalistas de outro. De acordo com estimativas da Agência Nacional de Petróleo (ANP), as reservas (que incluem 328 blocos planejados entre oferta, estudo e concessão) podem conter um volume total de óleo e gás de 30 bilhões de barris [1], o que colocaria o Brasil como o 4o maior produtor mundial, atrás de EUA, Arábia Saudita e Rússia [2].


Importância ambiental da Foz do Rio Amazonas


A região da Foz do Rio Amazonas é reconhecida mundialmente por sua importância ambiental para o planeta. O Rio Amazonas despeja a cada segundo 200 milhões de litros de água doce e sedimentos no mar, o que é fundamental para a manutenção do ecossistema do Oceano Atlântico. A chamada Costa Amazônica, que se estende por aproximadamente 2.250km, do Cabo Orange, no Amapá, à Ponta de Tubarão, no Maranhão, abriga 80% dos manguezais brasileiros, áreas ricas em biodiversidade. Em 2016, foram descobertos nessa região recifes de corais a profundidades que variam de 10 a 120 metros, alguns deles com mais de mil quilômetros de extensão constituindo o chamado Grande Sistema de Recifes Amazônicos (GSRA). Os manguezais e recifes são habitats e berçários de várias espécies de aves, répteis, anfíbios e peixes que são fundamentais para a sobrevivência de centenas de milhares de pessoas de comunidades tradicionais da região [3].



Mapa do Grande Sistema de Recifes do Amazonas
Mapa do Grande Sistema de Recifes do Amazonas

 

Exploração de petróleo e comunidades tradicionais


A exploração de petróleo na Foz do Rio Amazonas está deixando o povo de Oiapoque, na fronteira do Amapá/Brasil com a Guiana Francesa preocupado. O receio é de que ocorra na cidade o mesmo que em outras comunidades da Amazônia onde grandes empreendimentos, como os de mineração foram implementados: promete-se que a compensação financeira obtida com a exploração dos recursos naturais (royalties) melhorará a vida do povo, mas esse dinheiro só serve pra encher os bolsos de grandes empresários e dos políticos oportunistas de plantão. Outra falácia é a promessa de geração de empregos diretos. A maioria dos moradores de Oiapoque são pescadores artesanais, atividade responsável por 70% da economia local. A pesca artesanal gera trabalho e renda para ajudantes de pescadores, pessoas que preparam o pescado para vender nos mercados, comércio local que vende gelo, óleo diesel e mantimentos para as jornadas pesqueiras em alto-mar que duram até 20 dias. A atividade é uma opção para muitas mulheres e homens que deixam atividades como o garimpo e extração de madeiras ilegais para ganhar o pão de cada dia com a cadeia produtiva do pescado.


Na região existem várias comunidades indígenas que poderão ser afetadas pela exploração de petróleo, os povos Karipuna, Palikur-Arukwayene, Galibi Marworno e Galibi Kali’na são alguns deles. Esses grupos vivem em três Terras Indígenas (TIs) demarcadas e homologadas: Uaçá, Juminã e Galibi, que juntas abrigam cerca de 13 mil indígenas distribuídos em 56 comunidades. Esses povos mantêm relações históricas com os rios e o oceano e enfrentam uma enorme pressão do garimpo e da exploração de madeira em suas terras, algo que será agravado com o empreendimento petrolífero.

 

Impactos da exploração de petróleo na região


Os impactos que a exploração de petróleo na Foz do Rio Amazonas podem causar vão desde o aumento no tráfego aéreo e marítimo até a possibilidade de derramamento de óleo. No caso de as águas ficarem contaminadas com petróleo isso impossibilitaria a vida de quem nasceu e vive da pesca e o fim da rica biodiversidade da região. Durante a 76ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), que ocorreu de 07 a 13 de julho de 2024 na Universidade Federal do Pará (UFPA), discutiu-se o “Atlas de Sensibilidade Ambiental a derrame de óleo para a bacia marítima da foz do Amazonas”, elaborado por pesquisadores do Museu Paraense Emílio Goeldi (UFPA) e do Instituto de Pesquisas Científicas e Tecnológicas do Amapá (IEPA). Segundo os autores do documento, nenhuma decisão sobre exploração de petróleo na região pode ser tomada sem dados científicos que possam embasar essas decisões. No caso da Foz do Rio Amazonas, uma das últimas fronteiras para a exploração de petróleo no Brasil, existe um contexto singular com uma complexidade de ecossistemas de grandes extensões, diversidade de usos e características socioeconômicas [4].


De acordo com o Atlas, se ocorrer um vazamento de petróleo os ecossistemas da região da Foz do Rio Amazonas absorverão os hidrocarbonetos e a dificuldade de limpar os manguezais, florestas de várzea, áreas úmidas e praias é altíssima. Especificamente no Amapá, o litoral é composto por praias de lama, e não de areia como na maioria do litoral brasileiro. No caso de vazamento de petróleo não se consegue limpar retirando a areia.



Foz Rio Amazonas por Satélite
Foz Rio Amazonas por Satélite

 

Oportunismo da casta política


A casta política, principalmente do estado do Amapá, encampou a defesa da exploração do petróleo na Foz do Rio Amazonas. Figuras como o líder do governo, senador Randolfe Rodrigues (PT/AP) defende, com demagogia elevada a n-ésima potência que “o povo do Amapá precisa ter o direito de saber se tem ou não petróleo” [5]. Resta ao parlamentar petista esclarecer quem é o povo do Amapá para ele, pois nas audiências públicas realizadas no estado apenas empresários e políticos foram ouvidos não sendo permitida a palavra às organizações que representam a população, os pescadores e indígenas da região.


Outro representante da casta política amapaense e um dos principais entusiastas da exploração de petróleo na Foz do Rio Amazonas é o presidente do senado federal, Davi Alcolumbre. Eleito com 73 dos 81 senadores e apoiado por Lula, Alcolumbre foi o 6º parlamentar que mais recebeu as chamadas emendas PIX no ano de 2024 [6]. Em fevereiro de 2025, Alcolumbre recebeu Lula no Amapá e juntos montaram um palanque que faz parte da estratégia do petista de conquistar a reeleição em 2026 e o apoio de Alcolumbre para garantir sua governabilidade, usando para isso a exploração do petróleo na Foz do Rio Amazonas como moeda de troca.


Pré-Sal e Foz do Rio Amazonas: a mesma lenga-lenga


Em 06 de Abril de 2015, em discurso durante a posse de Renato Janine Ribeiro no Ministério da Educação, a então presidente Dilma Roussef dizia: “Os recursos dos royalties e do fundo social do pré-sal vão viabilizar uma verdadeira revolução na educação brasileira, que se realizará nas próximas décadas, mas que vai começar, progressivamente, a partir de agora. Aproveito para reafirmar que o pré-sal não é mais uma promessa, é uma realidade” [7]. Passados 10 anos, e como se fosse um disco arranhado, o Palácio do Planalto se pronuncia em nota oficial nos termos a seguir sobre a exploração de petróleo na Foz do Rio Amazonas: “É fundamental considerar a importância estratégica dessa riqueza, que pode, por exemplo, financiar a transição energética e colocar definitivamente o Brasil como a potência mundial da energia verde. Os recursos provenientes da exploração podem, ainda, possibilitar mais investimentos em ações voltadas para o combate ao desmatamento e em áreas sociais como educação e saúde" [8].


Isso sim é lenga-lenga, Lula!!!


Toda essa situação expõe o caráter oportunista da gestão petista que por um lado pretende se projetar como liderança mundial no enfrentamento às mudanças climáticas, utilizando para isso a Conferência das Nações Unidas sobre Clima (COP 30) que se realizará em Belém (PA) no mês de novembro, e por outro está firmemente empenhado em aumentar a exploração de petróleo no país, contribuindo para o agravamento das condições adversas do clima.


Existe alternativa ao petróleo?


A presidente da Petrobras tem defendido a exploração de petróleo na Foz do Rio Amazonas como medida urgente para a reposição das reservas do país. Com certeza sua principal preocupação é gerar lucro para os acionistas da empresa que dirige. A Petrobras depois de ser retalhada e atacada pelas políticas neoliberais, não é nem sombra da empresa estatal criada em 1953, fruto da grande mobilização popular na campanha “O Petróleo é Nosso”.

Depois das crises mundiais do petróleo de 1973 e 1979 que desmoronou o sistema energético capitalista, os países oprimidos pelo imperialismo tiveram a oportunidade de criar um novo sistema energético tendo por base as energias renováveis, tendo a biomassa como carro-chefe [9]. Apesar de iniciativas como o Pró-Álcool, implementada no Brasil, de forma geral, devido à herança e a mentalidade colonial impregnada a biomassa foi excluída dos planos energéticos destes países por ser considerada uma alternativa ultrapassada, subdesenvolvida e sem perspectivas.


Diferentemente do petróleo, a produção e utilização da energia da biomassa é distribuída sobre o território e descentralizada com a valorização estratégica da terra como fator de produção. Consegue-se com isso, promover a redução da dependência externa em nível nacional e regional com a criação de empregos e valorização do trabalho no campo favorecendo o meio rural e as empresas de caráter local em relação aos centros urbanos e ao grande capital [9].


A energia da biomassa embora utilize inicialmente tecnologias simples e mão de obra pouco qualificada não conduz necessariamente ao imobilismo tecnológico e social. O desafio tecnológico se apresenta como necessidade implicando a melhoria dos rendimentos energéticos e na produtividade do trabalho proporcionando um desenvolvimento industrial autossustentado, demandando mão de obra mais qualificada e valorizada.

A subserviência nos planos econômico, social e cultural às nações imperialistas impede que esse debate seja realizado com propriedade na sociedade dos países da América Latina, Ásia e África. A alienação nos meios universitários e técnico-científicos não permite o estudo e a compreensão da realidade que nos rodeia e a proposição de modelos de desenvolvimento para resolução dos problemas nacionais.


Que fazer?


Em “Os Subterrâneos da Liberdade” [10], Jorge Amado retrata a expedição ao Vale do Rio Salgado, no Centro-Oeste brasileiro. Composta por engenheiros estadunidenses e entreguistas de plantão, a comitiva tinha como anfitrião um ex-senador e latifundiário e por objetivo a construção da denominada Empresa do Vale do Rio Salgado, mais uma investida do imperialismo ianque sobre as riquezas nacionais. Contra esse “empreendimento” que mais uma vez prejudicava principalmente os camponeses estabelecidos na região, os revolucionários organizados no Partido Comunista se levantaram. Vemos a história se repetir com a proposta de exploração de petróleo na Foz do Rio Amazonas. Sob um discurso de desenvolvimentismo, sabe-se que os reais interesses são os dos imperialismos e mais uma vez a corja de entreguistas de plantão está disposta a tudo, à custa do sofrimento de centenas de milhares de brasileiros e da destruição do meio natural do nosso país, em nome do capital.


A tarefa dos verdadeiros democratas e revolucionários é defender os interesses dos povos originários e trabalhadores, bem como a conservação da biodiversidade da região. Esse combate deve ser travado diuturnamente nas ruas, nas escolas, universidades e junto às massas que devem ser mobilizadas e organizadas para essa luta.


REFERÊNCIAS:


  1. https://www.ibp.org.br/noticias/margem-equatorial-o-novo-pre-sal-brasileiro/

  2. https://www.intercept.com.br/2025/02/14/petroleo-foz-amazonas/

  3. https://www.brasildefato.com.br/2023/06/08/o-que-a-exploracao-de-petroleo-na-foz-do-amazonas-tem-a-ver-com-a-saude-dos-mares-do-planeta/

  4. https://repositorio.museu-goeldi.br/handle/mgoeldi/1205

  5. https://apublica.org/2023/06/exploracao-de-petroleo-assombra-pescadores-da-foz-do-amazonas/

  6. https://www.poder360.com.br/poder-congresso/alcolumbre-foi-o-6o-que-mais-recebeu-emendas-em-2024/

  7. https://siac.fpabramo.org.br/uploads/acaoinstitucional/Discursos_Presidenta_Dilma_2015_04.pdf

  8. https://www.bbc.com/portuguese/articles/c77r7e57ve6o

  9. HÉMERY, Daniel; DEBIER, Jean-Claude; DELÉAGE, Jean-Paul. Uma história da Energia. Brasília: Editora UnB, 1993.

  10. Amado, Jorge. (1954). Os Subterrâneos da Liberdade. (3 vols.).

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