O que o conflito na Caxemira indica?
- Redação
- 8 de mai.
- 4 min de leitura

No dia 22 de abril, vinte e seis turistas indianos foram mortos por um atentado na região de Pahalgam na Caxemira – território de maioria muçulmana disputado pela Índia e pelo Paquistão desde a sua independência, em 1947. Na verdade, os muçulmanos formam uma minoria oprimida no interior da Índia, cuja situação piorou ainda mais desde que o atual ministro, Narendra Modi, assumiu o poder com uma plataforma hindu-fascista. Como se sabe, a Caxemira é uma das regiões mais militarizadas do planeta Terra. O grupo islâmico Frente de Resistência reivindicou a ação, enquanto o governo indiano acusa o Estado paquistanês de conivência com os “terroristas”. Islamabad nega com veemência qualquer envolvimento.
Nesta terça (6), a Índia bombardeou o lado paquistanês da região, matando vinte e seis pessoas, a maioria civis, incluindo crianças. Houve centenas de feridos. A operação foi intitulada “Sindoor”, que nada mais é do que o pó cosmético tradicional usado por mulheres hindus para indicar o seu estado civil, o que ressalta a tentativa de o governo indiano estabelecer uma espécie de guerra entre civilizações para justificar não só sua agressão externa como a repressão interna aos movimentos de libertação nacional. A título de retaliação, o exército paquistanês acionou sua artilharia antiaérea e derrubou vários caças indianos, matando ao menos doze soldados. Antes da ação militar, o governo genocida de Modi havia declarado publicamente que bloquearia os rios que abastecem o Paquistão, nascidos na Índia. O governo paquistanês, por seu lado, replicou dizendo que consideraria qualquer mudança no fluxo dos rios um ato de guerra.
Na verdade, este conflito reflete o aumento das disputas interimperialistas mundo afora, no esteio da crise hegemônica norte-americana. Como disse o Presidente Mao, nos conflitos entre os diferentes “senhores da guerra” no interior dos países semicoloniais se refletem, ainda que mediadamente, as disputas entre diferentes potências imperialistas. Porque, de um lado, o conflito entre a Índia e o Paquistão – ambos com arsenal nuclear – tem sido instrumentalizado durante muito tempo pelas superpotências Estados Unidos, Inglaterra e União Soviética, até o fim do século XX; e atualmente tem como pano de fundo a emergência da China social imperialista e sua crescente disputa de hegemonia ao lado da Rússia contra os Estados Unidos.
Se a Índia, embora membro do BRICS, tem recebido contínua ajuda militar norte-americana a título de “combate ao terrorismo”, o Paquistão tem um papel fundamental no projeto Cinturão e Nova Rota da Seda: o porto de Gwadar, ligando a China ao Paquistão, é um dos corredores econômicos mais estratégicos da empreitada, já tendo mobilizado centenas de milhões de dólares em investimentos de Pequim. Por isso mesmo, também é estreita a parceria militar sino-paquistanesa, como por exemplo no desenvolvimento do caça JF-17 Thunder, desenvolvido conjuntamente pelos dois países. Outro aspecto é que a crise de hegemonia norte-americana também incentiva governos reacionários, ainda que de países não imperialistas, a ampliarem sua ação agressiva no “vácuo de poder” criado pela ordem que erode, a fim de se afirmarem como potências regionais. Este é o caso da própria Índia –que exerce uma influência em todo o subcontinente do sul da Ásia – e da Turquia, que tem um papel relevante na atual crise de decomposição do Estado sírio. É um jogo bruto de forças, em que os peixes grandes comem os peixes pequenos, prenunciando o amadurecimento de uma nova guerra mundial.
No caso da Índia, esta situação deve ser acompanhada com interesse ainda maior pela presença e intervenção na cena de uma força política consequente, o Partido Comunista da Índia (Maoista). O conflito com o Paquistão, se por um lado tende a reforçar o nacionalismo religioso e chauvinista de Modi, usado para justificar a ação repressiva contra os grupos “rebeldes”, por outro pode colocar este governo num cenário de lutar em duas frentes, ainda mais complicado no caso de sofrer derrotas políticas e militares. Esta grave situação também possibilita a união interna das diferentes forças que combatem o Estado indiano. Por isso, desde sempre, tem sido justa a posição dos naxalitas de defender o direito à separação dos muçulmanos da Caxemira e de combater o governo indiano e as suas facções regionais, que nada mais são do que expressões do capital burocrático-comprador pró-imperialista. Se a Operação Kagaar tem imposto milhares de dificuldades aos maoistas e às massas adivasis na Índia, a persistência numa firme política de independência mantida pelos revolucionários indianos, sem dúvida nenhuma será capaz de vencer esta dramática situação.
Sobre as supostas negociações por um cessar-fogo na Índia
A propósito, ressaltamos um ponto que para nós é de princípio: têm circulado em diferentes veículos e fóruns comunistas na internet notícias dando conta de possíveis negociações entre os maoistas e o governo de Telangana por um cessar-fogo. Em primeiro lugar, negociações que visem deter o banho de sangue, amarrar as mãos do Estado e revelar o seu caráter repressor para as amplas massas não só são possíveis como mesmo necessárias e já ocorreram em diferentes processos revolucionários, inclusive na China (vide as negociações de Chungching entre o PCCh e Chiang Kai-shek, das quais Mao participou pessoalmente, ao fim da Segunda Guerra Mundial). Atualmente, todos os defensores da Palestina exigem o cessar-fogo do governo sionista de Netanyahu.
Em segundo lugar, e não menos importante: temas desta natureza, sumamente sensíveis, ainda mais em um contexto de guerra – e sabemos que a propaganda e a informação são componentes decisivos em uma guerra –, só devem ser difundidos pelos genuínos apoiadores se vierem efetivamente de fontes oficiais, como o CC do PCI (M) ou algum porta-voz seu. Difundir notícias vindas de fontes indianas não confiáveis é no mínimo uma grave irresponsabilidade, de todo intolerável do ponto de vista do internacionalismo. Por isto, esta Revolução Cultural, não irá veicular nada referente a isto, e concentrará por todos os meios na denúncia sistemática e incansável da genocida Operação Kagaar, que é o que publicamente têm demandando os maoistas indianos.